(Leia a opinião do Financial Times e saiba o que pensam Jacinto Nunes, Silva Lopes e Artur Santos Silva)
Europa pressiona Atenas a evitar novas eleições
O impasse político helénico deixa os mercados cada vez mais nervosos. Líderes europeus fazem cheque-mate à Grécia.
Pressionar os partidos gregos a formar uma coligação governamental e evitar a todo o custo a realização de novas eleições. Essa é a estratégia que esteve ontem em cima da mesa dos ministros de Finanças do euro para evitar um prolongamento do impasse político que voltou a reactivar a incerteza dos investidores sobre a reversibilidade do euro.
À entrada da reunião, em Bruxelas, foram várias as declarações no sentido de um cheque-mate à Grécia, sobretudo dos países contribuintes. "Estas sugestões sobre uma saída [da Grécia] do euro são uma forma dos nossos amigos gregos perceberem o que está em jogo. Mas ninguém está a trabalhar nesse cenário", explica uma fonte comunitária associada a uma das declarações de pressão à Grécia nos últimos dias. Assim que for formado um Governo, "haverá uma pequena margem para negociar e rever eventualmente o calendário de ajustamento" no âmbito da troika, adiantou.
O presidente do Eurogrupo, Jean Claude Juncker, foi um dos que sugeriu recentemente conceder mais um ano à Grécia no seu ajustamento. Também, Didier Reynders, ministro belga dos Negócios Estrangeiros, indicou ontem a necessidade de ajudar a Grécia com "empréstimos mais longos" do que existem actualmente.
O mais explícito sobre a necessidade de evitar eleições foi o ministro irlandês, Michael Noonan. "Não creio que uma nova eleição ajude. Os elementos já lá estão, e o que ocorre na Europa nestes casos, por norma, é uma coligação". Em Atenas as negociações continuam, com o Presidente Carolos Papoulias a chamar hoje todos os partidos, à excepção dos neo-nazis.
Entre os ministros dos países contribuintes, o discurso para a Grécia em relação ao plano da troika é: pegar ou largar. O ministro alemão, Wolfgang Scháuble, deixou claro que "não é uma questão de ser generoso com a Grécia". "Não há dúvidas que o povo grego vai ter de sofrer as consequências de décadas de negligência. Não há caminhos fáceis para a Grécia, qualquer que seja o resultado".
Em Berlim, a chanceler Angela Merkel, derrotada nas eleições regionais de domingo, encorajou os gregos a aceitar o caminho do euro. "Acredito que é melhor para os gregos ficarem na zona euro, mas isso também exige que nós definamos um percurso em que os gregos possam voltar a caminhar pelo seu pé. E é óbvio que a Grécia o conseguirá", declarou Merkel. Porém, a "solidariedade termina" quando um país "não assume" os seus compromissos.
A ministra austríaca, Maria Fekter, disse que "para sair da zona euro a Grécia tem de sair da UE", o que é neste momento uma evidência legal nos Tratados. E Jan Kees de Jager, o ministro holandês, avisa que "não há alternativas à reforma e ao pagamento das suas dividas e se não o fizer isso é um problema não só para a Grécia mas para toda gente". A maior vítima desse contágio ontem foi a Espanha, conforme notou o ministro espanhol, Luis de Guindos. "A Europa está a viver momento complexo relacionado com Grécia" que está a provocar "um contágio nos mercados". A responsabilidade não é de Madrid, garante, porque tem sido exemplar nas reformas estruturais, "primeiro a nível laboral e agora a nível financeiro".
Mercados tremem com Grécia e Espanha
A instabilidade política teve eco nos mercados. As bolsas europeias tombaram entre 1,3% e 2,7%, contagiadas pelos receios em torno do impasse político que se vive na Grécia. Os títulos do sector financeiro foram os mais penalizados, com o índice da Bloomberg para o sector europeu a cair 3%. A bolsa portuguesa não foi excepção e caiu 1,9%, comló títulos no vermelho, a cotar no nível mais baixo desde 1996. O nervosismo também se espelhou na subida das yields da divida espanhola e italiana. E o euro voltou a cair durante o dia e atingiu o valor mais baixo dos últimos quatro meses.
Pedro Lino, CEO da DiF Broker justifica o comportamento dos mercados:" A performance negativa das bolsas é consequência da instabilidade na Grécia em torno da formação de Governo, da subida dos partidos de extrema esquerda e direita em diversos países europeus, de promessas feitas pelos políticos que são impossíveis de cumprir, da indefinição da política europeia e das necessidades de recapitalização de todo o sistema financeiro europeu, com o foco centrado em Espanha".
Perante estes dados não foi de estranhar que Espanha tivesse ontem pago juros mais elevados, face às anteriores emissões, para colocar 2,9 mil milhões de dívida pública a 12 e a 18 meses. Para Rui Bárbara, gestor de activos do banco Carregosa, este leilão "exerceu uma pressão muito negativa, sobretudo sobre a banca espanhola". Também a Itália foi ontem ao mercado colocar 3,5 mil milhões de euros de dívida a três anos. Um leilão que correu bem tanto ao nível da procura, como dos custos de colocação, que foram semelhantes aos praticados no leilão anterior nas mesmas condições.
Apesar deste facto positivo, não há razões para alívio ou optimismo. Tanto Rui Bárbara, como Pedro Lino, concordam que a volatilidade e instabilidade vão ser uma constante nos próximos meses.
Risco de Espanha bate máximos
Além da banca, Madrid está preocupada com as contas das regiões.
(Rui Barroso e Alexandra Brito)
Os investidores estão cada vez mais preocupados com Espanha e ontem o diferencial entre as taxas de juro a dez anos exigidas a Espanha e a Alemanha bateu o valor mais elevado desde a introdução do euro. Na base dos receios estão os problemas no sector financeiro, as projecções económicas sombrias da Comissão Europeia para a economia espanhola e a dificuldade das regiões autónomas colocarem as contas públicas em ordem.
Os juros espanhóis dispararam ontem de 6% para 6,2%. Esta subida, a par das descidas das taxas alemãs, levou o spread da dívida espanhola a dez anos face à alemã a atingir 477 pontos base, o valor mais alto desde a criação do euro. A bolsa espanhola foi uma das mais afectadas pela tempestade de ontem na Europa. Desceu 2,66%, com os sectores da banca e da construção a serem os que mais sofreram. A praça de Madrid já perde mais de 20% desde o início do ano, o que compara, por exemplo, com a descida de 4,95% do índice europeu EuroStoxx e com os ganhos de 9,39% da bolsa alemã.
O gestor de activos do Banco Carregosa, Rui Bárbara, referiu ao Diário Económico que "os mercados estiveram a digerir a quase nacionalização do quarto maior banco espanhol em termos de activos". As acções do Bankia perderam ontem mais 8,93% e resvalam 48% em 2012. Rui Bárbara classifica o problema do sector financeiro espanhol como "muito sério" e que tem origem na bolha imobiliária. Para este responsável, "o mercado imobiliário espanhol terá que cair algures entre os 35% e os 50% e os preços só desceram 20%, o que significa que há muito malparado que ainda vai acontecer com a consequente crise a contagiar a situação dos bancos".
O Governo espanhol apresentou mais um plano para a banca, o quarto desde o início da crise, onde prevê, por exemplo, que os bancos tenham de aumentar as provisões em 22 mil milhões de euros. Os economistas do Deutsche Bank e os analistas da Fitch consideraram-no positivo. No entanto, o banco alemão considera que o valor que o Estado espanhol prevê injectar na banca, um máximo de 15 mil milhões de euros, "é demasiado baixo para convencer o mercado de que estão a ser tomadas finalmente medidas decisivas". Os analistas alertam para o risco de Espanha ficar sem liquidez para acorrer à banca e ter de recorrer a fundos europeus para cobrir as necessidades do sistema financeiro.
Além dos problemas no sector financeiro, a Comissão Europeia divulgou na sexta-feira previsões negras para a economia espanhola, comum défice de 6,8% (um ponto percentual acima do previsto) e com uma dívida pública face ao PIB de 83% para este ano. As regiões autónomas são um dos riscos para Madrid conseguir cumprir com os objectivos das contas públicas. No fim-de-semana, por exemplo, o Executivo liderado por Mariano Rajoy, ameaçou que poderia ter de assumir o controlo das contas das Astúrias, já que o governo dessa região falhou em adoptar medidas para controlar as contas públicas.
EUROGRUPO ELOGIA AJUSTAMENTO EM PORTUGAL
O presidente do Eurogrupo e o comissário do euro saudaram ontem os progressos de Portugal na implementação do programa de ajustamento, vendo já resultados positivos na economia. "O programa está a evoluir bem", disse Jean Claude Juncker (na foto), que preside ao conselho de ministros do euro. "Há uma consolidação ambiciosa e reformas estruturas a ter ser aplicadas" e já se nota "um reorientação no sentido de um crescimento liderado pela exportações", além disso, o país vai agora continuar com novas reformas "no sector dos serviços e no sector do mercado de produto". O comissário Olli Rehn repetiu a ideia notando que tanto o programa irlandês como português "estão a correr bem". Juncker deu conta de uma longa discussão sobre Espanha e Grécia. No primeiro caso, há satisfação pela reforma do sistema bancário, e no segundo, a garantia de que a saída do euro "não foi defendida por ninguém". "Este não é tempo para relaxar os esforços", afirmou Juncker. "Faremos tudo para manter Grécia no euro", frisou.
Fitch espera novas medidas de austeridade em Portugal
Riscos de derrapagem nas metas orçamentais são "grandes".
(Mónica Silvares)
A Fitch espera que o Governo português adopte novas medidas de austeridade para conseguir cumprir as metas definidas com a troika. Apesar de considerar que as reformas em Portugal" arrancaram de forma promissora", há vários factores que sustentam um "optimismo cauteloso". Até porque, os riscos de derrapagem nas metas orçamentais são "grandes".
"As nossas previsões de crescimento são mais pessimistas do que as da troika, o que coloca em risco a execução do programa", disse, ao Diário Económico, Maria Malas Mroueh, a analista da Fitch. "Por isso, o Governo vai ter de adoptar mais medidas de austeridade". No entanto, a responsável que acompanha a economia nacional recusou especificar se as medidas devem ser do lado da receita ou da despesa.
Num relatório especial dedicado a Portugal, a Fitch reafirmou ontem a sua previsão de contracção da economia nacional de 3,7%, a mais pessimista de todas as instituições internacionais - e que "já incorpora as medidas adicionais", que a Fitch antecipa, especificou a analista. Para 2013, ao contrário do Governo, do Banco de Portugal ou da própria troika, a Fitch antecipa, uma contracção de 1,5%, ou seja, o país vai continuar em recessão.
"Não vemos como será possível melhorar de uma contracção de 3,7% para crescimento, de um ano para o outro", diz Maria Malas Mroueh, rejeitando comentar se o Executivo de Pedro Passos Coelho deve adoptar medidas de promoção do crescimento ou negociar com a troika uma extensão dos prazos. Mas lembra que "um crescimento mais robusto facilitaria a execução orçamental".
A esta equação a Fitch acrescenta a previsão de uma taxa de desemprego mais elevada (14% em 2013) que "vai pressionar a despesa", quando a redução da mesma "está dependente de reformas no sector da saúde que cortem os custos e de uma maior disciplina dos governos regionais e municipais".
A agência de notação financeira - que classifica Portugal com um BB+, com perspectiva negativa, a par com a Costa Rica, a Hungria, as Filipinas ou a Turquia - alerta que "o programa [da troika] só poderá ser bem sucedido se houver um compromisso político contínuo relativamente à consolidação orçamental e às reformas estruturais", sublinha o documento. A Fitch alerta ainda que, "caso haja sinais de que o ajustamento não está a funcionar tal como planeado (por exemplo, uma recessão muito mais pronunciada acompanhada de falta de progresso na redução de ambos os défices), isso conduziria a uma forte pressão para reduzir o rating".
Entre os factores de risco orçamental está ainda o Sector Empresarial do Estado, "causa de várias revisões em alta da dívida e do défice públicos desde 2010 ".
Num momento em que se discute a dificuldade de acesso aos mercados, a Fitch está confiante que Portugal receberá mais financiamento, "nas mesmas condições do programa anterior" caso não seja possível regressar aos mercados em 2013, desde que as metas do programa continuem a ser cumpridas.
"A Europa está a viver momento complexo relacionado com Grécia" que está a provocar "um contágio nos mercados", disse o ministro espanhol Luis de Guindos.
"Não há alternativas à reforma e ao pagamento das suas dívidas. Se a Grécia não o fizer é um problema não só para ela, mas para toda a gente", disse o ministro holandês, Jan Kees Jager.
O presidente da CGD, Faria de Oliveira, disse que "a Europa precisa mesmo de crescimento" e considera "desejável" a permanência grega no euro.
Só firewall europeia pode salvar Portugal se Atenas sair do euro
Saída da Grécia terá custos muito grandes para Portugal, dizem os economistas contactados pelo Diário Económico.
(Luís Reis Pires)
A saída da Grécia da zona euro será sempre uma solução catastrófica, defendem os economistas portugueses. A indefinição política em Atenas está a aumentar os receios de que a economia helénica abandone a moeda única ainda este ano, sem que os responsáveis alemães se mostrem particularmente preocupados com a hipótese. A concretizar-se a saída da Grécia, o destino de Portugal vai depender da capacidade da Europa em criar uma verdadeira firewall para proteger o euro e da vontade dos líderes em colocar Portugal ao abrigo dessa barreira de protecção.
Paul Krugman deu ontem o alerta, num post no seu blogue no NY Times: "Uma saída da Grécia do euro, muito possivelmente no próximo mês", antecipa o Nobel da Economia em 2008. O economista norte-americano é apenas a mais recente voz a alertar para o risco cada vez maior de Atenas deixar a moeda única. O Financial Times também já alertou para isso. O Der Spiegel, por seu lado, aconselhou mesmo a Grécia a seguir esse caminho. E os responsáveis alemães têm feito declarações nos últimos dias como que a preparar os europeus para tal cenário.
Perante tal hipótese, voltam a surgir as vozes que diferenciam Lisboa de Atenas. Ontem foi a vez do presidente da Fundação Gulbenkian. "Há um contraste enorme [entre os dois países]. Primeiro, pela capacidade real de produção de bens e serviços. Portugal, em relação ao PIB, exporta quase o dobro do que exporta a Grécia. Portanto temos uma economia muito aberta à competição internacional", disse Artur Santos Silva, acrescentando que Portugal tem "uma capacidade de enfrentar os problemas com realismo, com bom senso e procurando vencer situações difíceis".
Mas, apesar do contraste, uma saída da Grécia do euro vai sempre prejudicar Portugal, diz lacinto Nunes. A saída da Grécia "é uma possibilidade real", avança o economista e ex-ministro das Finanças, que não tem dúvidas de que a saída desordeira será "um inferno" e que "vai ter custos muito grandes" não só para Portugal, mas para toda a Europa. No entanto, admite, os países da periferia são os que sofreriam mais. No caso da economia nacional, "depende da reacção dos mercados e da forma como as instância europeias lidarem com a situação". Ou seja, "se houvesse uma certa compreensão" e "se actuasse no sentido de proteger Portugal e outros países da periferia, poderíamos evitar ir atrás".
Silva Lopes, que se mostra "muito preocupado" com a situação, concorda que o futuro de Portugal "depende de saber onde os países europeus põem a firewall " para proteger as restantes economias. "Das duas uma: ou criam a firewall deixando apenas a Grécia de fora, e aí ainda escapamos, ou então - e, ao contrário do que acontece com Espanha e Itália, há esse risco - deixam Portugal de fora e é uma catástrofe". No entanto, ainda tem "esperança" de que a tal barreira de protecção englobe Portugal. "Temos uma estabilidade política muito razoável, o povo está a encaixar melhor o programa do que o povo grego e estamos a fazer um esforço para resolver os problemas. Aliás, o que estamos a fazer não nos está a criar problemas, o que os europeus estão a fazer é que nos está a criar problemas", diz. No entanto, conclui, a saída da Grécia do euro "será sempre uma solução catastrófica".
As opiniões vão ao encontro da análise feita pela Fitch. Num relatório publicado ontem, a agência de rating defende que o regresso de Atenas ao dracma, seja feito de forma ordeira ou desordeira, vai sempre afectar a Europa, em especial Portugal, Espanha e Itália. "O efeito de contágio de uma hipotética saída da Grécia do euro poderá prejudicar as empresas em toda a Europa, mas sobretudo no caso de uma saída desordeira", lê-se no documento. Nesse cenário, haveria "amplas vagas de choque" em todo o sector empresarial europeu.
Caso a saída fosse devidamente planeada e executada, a saída da Grécia não afectaria tão directamente as empresas, mas criaria um efeito dominó de sucessivas revisões embaixa dos ratings dos países europeus, agravando as condições de financiamento soberanas e do sector privado. Seja qual for o cenário, conclui a Fitch, o choque será sempre maior na Península Ibérica e em Itália.
Estado grego fica sem dinheiro em Junho
"E possível que o Governo não possa pagar salários e pensões já em Junho", avançou ontem o jornal grego "Atenas Ta Nea" , citando o Presidente da República do país. A informação sobre as contas do Estado terá sido apresentada pelo Chefe de Estado Carolos Papoulias aos líderes dos partidos políticos no domingo, durante as negociações para a formação de um Governo de unidade nacional. A Grécia vive um conturbado momento político, já que nenhum partido conseguiu alcançar nas eleições um resultado que lhe permita governar sozinho. Caso não seja possível formar Governo haverá uma nova ida às urnas, porque os dois únicos partidos que apoiam o programa da troika - Pasok e Nova Democracia - não têm votos suficientes para governar sem o apoio de um terceiro partido. Já o Syriza, o partido de esquerda radical, insiste em novas eleições. O líder do Dimas - partido da esquerda moderada -, Fotis Kouvelis, admitiu ontem que não será possível um Governo de coligação, já que Pasok e Nova Democracia não contam com o apoio de mais nenhum partido, enquanto o Syriza recusa reunirse com as restantes forças políticas. O prazo para formar Governo termina quinta-feira, depois segue-se para eleições.
"Se houvesse compreensão" à saída da Grécia e "se actuasse para proteqer Portugal e outros países da periferia, poderíamos evitar ir atrás", diz Jacinto Nunes.
"Ou [os líderes europeus] criam a firewall deixando apenas a Grécia de fora, e aí ainda escapamos, ou deixam Portugal de fora e é uma catástrofe", diz Silva Lopes.
"Há um contraste enorme" entre os dois países. "Temos uma economia muito aberta à competição internacional", disse Artur Santos Silva.